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Paradoxo Nicotínico

Corria meio devagar bem depressa saindo de um posto de gasolina sem lembrar bem o porquê de estar ali. Ele estava ansioso, tão mas tão ansioso que a cada tragada que percorria a garganta que lhe deu fumaça, o suspiro recebido que saía vinha bem sem graça. Vestia uma roupa de temporal mas queria mais aparentar outonos do que propriamente invernos. Foi de encontro a padaria e por um instante antes de atravessar a rua um sujeito lhe parou e disse:


— Ei, bom dia, poderia por favor, me dar um palito de cigarro? Os meus da minha carteira acabaram.


Foi num tom de tristeza não tão melódico que o sujeito pediu o cigarro. No que ele respondeu:


— Bom dia! sem problemas, pegue o meu.


Os dois partiram em agradecimento, o cigarro agora ia junto do sujeito não tão na metade nem tão no começo. Um pouco menos depressa diga-se de passagem o sujeito seguiu a esquina da avenida onde descia para o centro uma das praças de seu bairro, a bela vista encantava no que tornava cinza tudo em volta do sujeito. Era mais calmo e menos preocupado, vestia uma bermuda e não queria aparentar outono nem qualquer estação, não parecia ser dali, mesmo já tendo morado lá há anos. No caminhar de passos serenos, perto de uma barraca de pipoca aonde brincava um pai, uma criança e seu cachorro, uma mulher de vestido florido lhe faz pergunta pouco comum para o que o restante deste mundo lhe esperaria.


— Ei senhor, bom dia! Meus cigarros acabaram, você tem um para me dar?


Pediu ela como uma pergunta tão comum de se fazer no cotidiano. No que o sujeito respondeu.


— Bom dia! Os meus também acabaram, esse é o meu último, acabei de pegar com um rapaz, mas não tem problema, pode ficar.


Mais uma vez em despedida de obrigado, os dois saíram. A mulher agora com o cigarro na metade já seguia em um andar largo não tão curto, contudo rápido o suficiente para o chegar, partiu de volta a avenida sentido o contrário, sem entender muito bem o que se seguia, um homem a observava de longe, ela fingia não perceber mas quanto mais rápido andava mais o passo se apertava, ainda não era hora do almoço e na rua se via pouca gente para uma manhã de domingo, algumas poucas pessoas saindo da igreja mas nada além disso. Enquanto andava ela tentava buscar refletir, "será se estou sendo pretensiosa, será que é puro preconceito de minha parte?", nenhuma dessas questões seriam respondidas pelos sons de chinelo que faziam os passos do rapaz que aparentava a perseguir. Ele estava chegando mais perto, ela cada vez mais distante, ele se aproximava ainda mais, ela não media esforços para não chegar perto. Então como num suspiro de desespero, ele grita:


— SENHORA! O SEU ISQUEIRO CAIU!


Ela para por um instante, olha para atrás e perplexa percebe que é o rapaz que perseguia ela que estava falando com ela. Ela não podia acreditar.


— Nossa, muito obrigado!


E num tom de alívio com misto de desespero ela seguiu de volta ao caminho para a padaria, no que o rapaz diz.


— Se não for lhe incomodar muito, poderia me fortalecer um cigarro por favor?


Pediu ele meio sem jeito.


— Os meus também acabaram, esse é o meu último, acabei de pegar com um sujeito, mas não tem problema, pode ficar.


Ela diz isso com pressa e num ar de agradecimento se sobressaem os seus caminhos. O homem agora com o cigarro menos da metade seguia balangando pelas ruas em passos similares a de uma ovelha, não por ser animalesco mas pois andava delicado com um estilo selvagem. A fumaça que saía da sua boca era pouco similar as demais, era colorida e de damasco. Se não fosse pela sua blusa cor de amanhã, certamente lhe confundiriam com algum outro pelo o qual se assemelharia ao pretérito imperfeito do presente que lhe dava tragar. Com um pouco mais de sorte, tudo travava como se esperava em sua vida para uma manhã de domingo, embora isso fosse apenas o que ele esperava. Enquanto os últimos tragos eram dados, mais a frente se via o restante daquilo que se pouco ansiava. Alguém grita "PARADO, MÃOS NA CABEÇA", no que ele ouve assustado em conjunto os gritos de "FOI ELE, FOI ELE MESMO". Eram três policiais, um ainda dentro da viatura espreitava a janela com desdém e olhar de desgosto, os outros dois demais em exaspero apontam seus fuzis para o homem. Um dos policiais mais a frente apontava a arma na direção do seu rosto dizendo:


— Vai jogando a porra desse cigarro fora vagabundo!


Ordena ele com ar de ameaça. Enquanto a voz feminina áspera no fundo diz.


— FOI ELE QUEM ROUBOU O POSTO DE GASOLINA E AINDA LEVOU CIGARROS COM ELE.


No que o homem responde:


— Os meus cigarros acabaram, esse é o meu último, acabei de pegar com uma pessoa, mas não tem problema, pode ficar.